domingo, 6 de maio de 2012

mais ou menos? uma questão de direção


Há algum tempo venho me observando diante de uma situação que tem produzido certa estranheza: minha escrita se calou! Nada que não aconteça vez ou outra, até porque toda produção é cíclica, e a escrita não é – ou para mim nunca foi – uma exceção a esses movimentos ondulares das tantas faces que compõem nossas vidas. A parte interessante desse silêncio, especialmente para um praticante de psicanálise, é conseguir apreender algo de si a partir do que fazemos, ou do que deixamos de fazer – temporariamente, nesse caso. A observação do silêncio como um momento, algo temporário e passageiro, em si já denuncia duas coisas: o desejo de seguir escrevendo (e o temor ligado, por oposição, ao silêncio como fim) e o saber de outras palavras que encontraram sua calada definitiva. Pois é certo que já experimentei o silêncio em tantas outras expressões que um dia falaram muito de mim.

Hoje eu tive um dia delicioso, em companhia de minha esposa e meu afiliado – o Dado – no clube. Jogamos bola, fazendo uso de uma certa licença poética para chamar aquilo que eu faço dentro de um campo de futebol de jogar bola. Há momentos em que realmente é difícil discernir, ao olhar para mim e a bola, quem está movimentando quem. Vou deixar de lado o exagero crítico e evitar – exibindo – a piada de que, mesmo a forma, parecem me colocar diante da bola muito mais na condição de um fiel companheiro do que de alguém que tem a habilidade de fazê-la rolar levemente sobre a grama verde. Mas afinal, a companhia e a possibilidade de continuar tentando servem como uma fonte de prazer, a despeito da dor nas costas que agora começa a me maltratar.

Depois de lutar bravamente para não envergonhar meu querido afilhado, almoçamos na lanchonete do clube e fomos ver, ainda nas dependência do clube, o filho de um casal de amigos enfrentar o Corinthians, em um jogo – esse de verdade – de meninos da categoria “sub-12”.... ou seja, jovens atletas de até 12 anos de idade. Apesar de estar absolutamente ciente de que, caso eu jogasse em um daqueles times, eu certamente prejudicaria seu desempenho, isso não me incomodou, e pude me divertir... afinal, embora sempre tenha praticado e goste muito de esportes, futebol e eu nunca experimentamos uma relação de grande intimidade. Sempre coube a mim um nobre lugar no banco de reservas e nas arquibancadas dos estádios, que ainda freqüento com grande alegria.

No final do dia, quando já estávamos prestes a ir embora, fui buscar o Dado nas quadras, mas ele não estava mais jogando futebol: estava em uma quadra de basquete. Bem, aí as coisas mudam de figura, pois fui um jogador apaixonado em toda a minha juventude, e o banco não era o meu lugar preferido. Esse foi um dos esportes em que o conjunto quadra e bola me permitiu encontrar habilidades, viver a competição, sentir o gosto da disputa e o sabor da vitória e da derrota, sempre acreditando que melhorar era uma questão de tempo e empenho.

Prefiro evitar datas e deixar, acompanhando a forma de nossos registros: nesse caso, a lembrança de que eu jogo basquete, embora não entre em uma quadra há algum intervalo de tempo entre 1 ou 30 anos..... em nossas lembranças, em nossos afetos, que diferença faz? Eu jogo basquete, não importa há quanto tempo eu não o faça. Então, orgulhoso de poder afinal trazer orgulho ao meu afilhado – ou a mim mesmo, hei de assumir – entrei na quadra “senhor” da situação. Alguns arremessos logo de início pareceram indicar que eu nunca havia saído dali, mas o início foi um lapso de tempo distante do que se seguiu. A cesta estava muito mais alta, meu braços mais pesados, meu corpo mais lento, e minha mente comandava movimentos que simplesmente não eram executados, e faziam da glória esperada algo muito mais parecido com uma comédia. Mas eu não estava brincando.... eu estava levando a sério! Eu, afinal, sou – para todos os efeitos referidos à minha própria maneira de me ver, ou seja, à minha própria identidade – um jogador de basquete.

Outros episódios de falta – hoje mesmo – já haviam marcado minhas então feridas percepções. Mas foi ali, naquele exato momento, que eu percebi como é fácil ter sua voz, sua escrita, seu “jogo”, deixados mudos quando não podemos ser ou corresponder a quem entendemos – ou antes, experimentamos – ser.

Depois de uma ressaca moral de movimentos desajeitados produzidos por um corpo que não é – evidentemente – mas se faz, a cada dia, a cada gesto, e que além (ou acima) de tudo, atende pelo nome de meu corpo, voltei para o calor da minha casa, envergonhado e renovado.

De uma só vez eu havia experimentado o vexame e o balanço.... da vida, do construir, do perseguir, do perseverar, e do motivo de meu silêncio. Sim, o que me calava, ou antes, calava a minha escrita (porque a minha boca parece ter vida própria!) era a vergonha. Limão ou limonada? Uma vez entendida a prisão, é uma questão de saber-se ou não capaz de superar suas cercas, seus arames, encontrar o equilíbrio para se esgueirar sobre seus muros na direção da liberdade; passageira sim, mas recuperável enquanto houver vida e sangue em minhas veias.

Após alguns anos estudando – e lendo – autores extremamente capazes, cultos, embasados em suas colocações e testados em suas teses, o temor da ingenuidade, da escrita rasa, da simplicidade, do legível e acessível a todos, inibiram a minha escrita, que tem nesses elementos uma de suas principais marcas.

Abriu-se hoje a chance de voltar a desfrutar minha saborosa limonada! Simples, direta, legível, ampla, livre!

Repetindo uma fala de meu último texto, aquele sim, impregnado pelo temor da vergonha, delibero retomar minha pena..... estou de volta!

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Trilhos


E de repente aquela voz mineira,

 

Cantando a vida em trilhos,

estações.

 

Verão a gente que entra? Sai pra nunca mais...

 

Quantos cantaram, visitaram em melodias de versos e prosa a metáfora sobre dormentes?

 

A vida se repete na estação?

A voz me vem com força, dormentes as minhas mãos, os meus pés, . . .   eu   . . .

algo entre real e cru

 

marcas, Marcos, marias-estações,

m  o  v  i  m  e  n  t  o  ,

 

vagão, vertigem, fumaça,

 

                         carne!

 

A música pede passagem?

 

Ou o tempo exibe seus rasgos, pautas,

                                                              ex-pressões?

Inalo a certeza de não saber.... NADA, NUNCA!


E formalmente delibero seguir viagem! – Não, eu não entendi: experimentei o sutil sabor da diferença.