quarta-feira, 19 de junho de 2013

E a política? (2)

Há duas semanas, um pouco mais, um pouco menos, escrevi um texto que chamei de “E a política?” no qual visava expressar minha indignação com o atual estado de coisas que vivenciamos em nosso país. Dados os últimos acontecimentos, que estão fervendo nas ruas e nas cabeças da população brasileira, decidi escrever esse texto, mas em uma espécie de seqüencia lógica (?) do anterior. Digo seqüencia lógica e coloco o parêntese para já começar questionando um pouco a idéia de lógica. E já anuncio, de saída, que para escrever um texto sobre o assunto que todos estão discorrendo e elaborando, é preciso buscar novas perspectivas, novas seqüencias, novos desdobramentos, onde o risco seria o de repetir o que outras penas já imprimiram em tantos papéis: jornais, revistas, sites, cartas, e-mails, e quantas outras formas sobre as quais as velhas penas, embebidas em potes de tinta, ganharam novas cores.

Para todo evento há um antes e um depois. Parece-me que o antes dessas manifestações está bastante claro, e ainda que as versões sejam muitas, como deve ser, há pouco a acrescentar sobre isso. Mas o depois ainda é mistério, incerteza e dúvida, mesmo para os próprios precursores do movimento que, que se tinham uma agenda no seu início, viram somar-se a ela outras tantas agendas no seu transcorrer. Emolduro as minhas observações sobre os motivos desse movimento e suas dimensões – o  “antes” com pitadas de “durante” – sobre alguns pontos que me chamam a atenção, e sobre os quais ainda acho que há algo a acrescentar no campo das reflexões para, então, seguir para o “depois”, suas possibilidades ou impossibilidades.

Fazendo uma recapitulação do acontecido, volto ao primeiro dia das manifestações, seus primeiros passos, e o contexto sobre o qual esse evento teceu seus fios, e ganhou as malhas de uma classe média extorquida e aturdida, embora calada, por hábito ou comodismo. Um grupo de estudantes, indignados com o aumento no valor das tarifas de ônibus (conteúdo expresso de suas queixas) resolveu se unir em protesto. Houve uma ação policial forte, possivelmente desproporcional (mas sobre cuja “proporcionalidade” – atenção às aspas – vou tentar me estender um pouco), mas o movimento não parou. No segundo dia de manifestações, a ação policial ficou evidentemente mais corpulenta e claramente voltada para coibir a manifestação antes que essa ganhasse corpo... o gatilho foi disparado: de um lado, as balas de borracha, de outro a população tomada de indignação e revolta pela ação de uma polícia que se mostra incapaz de defender os cidadãos (e declara isso seguidamente em frases como “não temos efetivo suficiente” – “explicação” literal dada pelo comando da Polícia Militar para o número exagerado de ocorrências na última “virada cultural” na cidade de São Paulo), mas é capaz de ataca-los de forma incrivelmente eficiente quando algum interesse maior do que o direito de ir e vir do cidadão comum está em questão (suspeito ser essa a via que explica a “proporção” da resposta policial). De outro lado, uma população à beira do penhasco de suas esperanças e aspirações, que entende o recado e sai às ruas, agora não mais com um único propósito, mas com vários de uma mesma origem: uma indignação crescente contra um estado ineficiente, corrupto, vendido (literalmente!), que usa o recado das urnas para justificar suas falcatruas, seus interesses e esquecer, ou deliberadamente abandonar, suas obrigações essenciais. Aqui as minhas perguntas são poucas e muito claras:

  1. Onde está esse pelotão de choque, que tem capacidade de ação contra dezenas de milhares de pessoas, quando estamos presos em nossas casas, encarcerados por uma escalada de violência que não conhece limites e fronteiras, que assalta (ou arrasta) restaurantes, casas, condomínios pedestres, motoristas, táxis e quem mais vier?
  2. O que motivou uma reação tão pronta e dura da polícia, ou qual sua voz de comando? Será essa voz de comando a mesma que explica a referida desproporção da resposta policial? (o valor dos interesses a serem “defendidos”)
  3. Por que motivo a mídia televisiva permaneceu absolutamente calada enquanto a polícia atirava balas de borracha (balas são balas, e ferem ainda que não matem!) e descia a “porrada”, com o perdão da expressão, nos manifestantes? Repito a pergunta anterior: qual sua voz de comando? Quais os interesses que defendia enquanto jovens eram espancados nas ruas da cidade? Seria censura, seria alguma posição partidária ou o dinheiro investido na realização e na compra dos direitos de transmissão da Copa das Confederações, da Copa do Mundo e das Olimpíadas?
Não vou me ater às discussões sobre o “vandalismo”, exceto para dizer que foi clara exceção e, possivelmente, teve a mesma voz de comando que questiono nas duas perguntas acima, pois nada melhor para acabar com um movimento do que produzir seu descrédito “de dentro pra fora”. “Plantar” falsos manifestantes que depredam e agridem é uma estratégia tão antiga quanto as batalhas da Pérsia, e da qual nossos governantes e seus heróis são profundos conhecedores. Chamo a atenção para a armadilha da ingenuidade e para um segundo olhar. Quem tiver dúvidas, veja as imagens dos manifestantes tentando conter os “vândalos” na porta da Prefeitura de São Paulo, da Câmara Municipal e do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, e pense um pouco mais sobre o assunto.

Chego ao ponto que considero ainda pouco falado, e sobre o qual toda essa situação merece a máxima atenção. Vivemos supostamente em um estado democrático de direito, onde as urnas são o maior capital e a principal força política que uma a população tem e deve usar. É nas urnas que devemos nos manifestar, e fazê-lo de forma veemente, clara, inequívoca e ciente do que está em jogo. As manifestações das ruas são mais do que importantes: são válidas, lindas e encorajadoras de um processo de mudança que, contudo, só será levado a termo se soubermos quem é mandatário de quem, que interesses defendem os candidatos a vereadores, a deputados (estaduais e federais), a senadores, e às esferas municipais, estaduais e federal do poder executivo.

A hora de fazer a cola para as urnas é agora, e não um dia antes da eleição! Anotem quem vota a favor da PEC 37, quem vota em Feliciano (s) e Collor (s) para presidir comissões, quem apóia Sarney e seu bigode indefectível, quem abraça quem, quem se mostra e quem esconde sua cara. Vejam quem pede votações fechadas, quem marca reuniões escondidas, quem constrói estádios padrão FIFA para esse país sem padrão, sem plataforma, sem base, sem direitos. Lembrem-se da mobilização pela realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas em terras nacionais, e das respostas das autoridades quando pessoas são assassinadas em assaltos às 11:00hs da manhã. Isso é desproporcional, muito! Quem não suporta mais a impunidade de Marias e Dirceus não pode deixar que as urnas sejam uma “obrigação de cidadão” o que, em si, é um tremendo contra-senso: como um direito democrático (ou em nome de que?) pode ser transformado em obrigação? Quem ganha com isso? Quem leva as urnas àqueles que a elas não teriam acesso e em nome do que: da sua possibilidade de exercer a cidadania, ou da garantia de um voto para um mascarado que sai de São Paulo ou do Rio de Janeiro pra se eleger em Roraima ou tais?

Esse movimento deve crescer e amadurecer. Esse amadurecimento deve, necessariamente, passar pelos motivos – tão bons quanto forem próprios – pelos quais caminhamos em direção às urnas.

Encontrar a própria voz é não mais deixar-se calar!


segunda-feira, 3 de junho de 2013

E a política?

E a política?

Tenho escrito nesse blog já há algum tempo, e por algum motivo (posso pensar em vários, mas prefiro não perder o foco), não escrevi nada de conteúdo político. Importante dizer que a política é a atividade humana essencial... não existe o famoso “sou apolítico”, pois se eximir de uma posição já é uma forma de se posicionar. Em um mundo e um país “teoricamente” democrático, expressar posições e partilhar reflexões é um exercício de cidadania, senão uma obrigação de cidadão. Sim, entendo que ser cidadão é dizer abertamente no que se acredita, em quem se acredita, o que se espera, criticar e propor soluções, e partilhar suas posições diante de outros votantes cidadãos, que acostumados a, como eu, apertar os botões da “aclamada urna eletrônica”, nem sempre o fazem por um motivo à altura do que esse “pequeno grande” gesto representa.

Tenho expressado, em doses pequenas e de forma um tanto dispersa, um claro desagrado com os rumos que vêm sendo traçados e levados adiante desde a eleição do nosso primeiro “presidente operário” e que, em função de uma crise econômica, sobre a qual cabe me estender um pouco mais, ficam ainda muito mais evidentes na vigência do mandato da atual presidente da nossa república.

Começo com uma pequena reflexão sobre os nossos recentes milagres: da estabilidade econômica (herdada de gestão anterior) ao “espetáculo do crescimento” (acidental e insustentável, como as evidências começam a explicitar), passando, com o devido destaque, pela crise financeira mundial que, segundo o então presidente da nossa república, foi causada pelos homens brancos de olhos azuis. Esse senhor, que despertou a curiosidade do mundo por sua incrível trajetória pessoal e política, jamais se vexou ao verbalizar pérolas que, em outros tempos, teriam causado horror nos meios de comunicação e na sociedade civil. Entorpecidos pelo romance que representava a ascensão de um homem simples e de poucos recursos (e ressalto que esses poucos recursos, no que diz respeito aos seus aspectos financeiros, são assunto de um passado remoto, e não têm nenhuma relação com a situação atual do senhor de codinome Lula e sua afortunada família) ao cargo mais alto do Poder Executivo de nossa multicultural nação brasileira, perdemos o senso crítico e deixamos que nossa capacidade crítica fosse eclipsada pelo romance. Seria empolgante escrever ou ler a biografia do senhor Lula, mas tê-lo como Presidente e acompanhar a luta pela manutenção de um claro projeto de poder elaborado e cuidadosamente colocado em prática pelo Partido dos Trabalhadores é um outro assunto, de implicações desastrosas e grande ônus ao nosso país. E para quem ainda não percebeu, digo nossa república, nosso país, pois é disso que se trata... nem um milímetro a menos do que a afirmação inequívoca de que essa terra é nossa, dos cidadãos que, ao se calar, consentem com o que concordam (nenhum problema nisso) e com o que discordam (e aí o problema é evidente!).

Pois me vejo mobilizado a seguir com alguns episódios recentes, que podem parecer se tratar de uma questão apenas – a segurança pública, já me adianto – mas falam de muito mais coisas: são a expressão clara de uma nação que perdeu a voz e o respeito, que não tem representação política e ativismo, que está embriagada ou aturdida por um descalabro que já não parece ter início, e muito menos fim. Cito 3 episódios recentes na história de São Paulo: 3 latrocínios (roubos seguidos de morte) onde o fruto do assalto havia sido entregue aos criminosos e nenhuma reação foi esboçada, mas aqueles, os criminosos, mataram suas vítimas após obter o fruto de sua investida. Mataram por que? Porque para eles não faz a menor diferença! Mataram porque não têm qualquer respeito pela vida e pelo outro, e porque sequer o sistema penal, leniente e ultrapassado, inibe com rigor esse tipo de ação. Ressalto também que uso a palavra criminosos, porque é essa a que define o que são e fazem e porque, em nossa sociedade precária mas preocupada com um discurso politicamente correto, tem sido desastrosamente substituída, como lamentável fruto de análises banais e supérfluas, por outras, que exibem suas tendências e irresponsabilidade pela via de um discurso pseudo intelectual acadêmico – vítimas do sistema, excluídos, minorias, e outras formas de ideologia que pregam a desigualdade (injusta, com certeza!) como origem de todos os males. Eu diria que, no mínimo, essas pessoas nunca ouviram falar do país com a segunda maior população do planeta, a Índia, que convive com um nível de miséria terrível e um índice de violência extremamente baixo.
Vivemos em um país rico ou em um país carente, afinal? Segundo o senhor Lula, vivemos na Suíça em franco processo de formação. Imagino que a “unidade partidária” e a atual Presidente também concordem com essa leitura. Na minha opinião, não menos importante, de um cidadão pleno de suas capacidades mentais e críticas, embora branco e de olhos azuis (devo pedir desculpas por isso??), vivemos e estamos construindo um país cada vez mais carente: de educação, de infra estrutura, de educação elementar, de saúde (são essas as obrigações do Estado) e de valores morais, de respeito, de dignidade, de seriedade, de compromisso, de um quadro político minimamente decente e comprometido com seu mandato. E paro para mais uma pequena reflexão: a palavra “mandato” indica que esses senhores e senhoras, eleitos pelo povo, são seus representantes e exercem em seu nome (da população civil) um mandato... são mandatários de uma vontade popular e sua obrigação é lutar por esse mandato; nada mais, nada menos! Políticos de carreira, comuns no Brasil, são um desastre, uma distorção lamentável de uma herança, e por que não dizer, de um Estado caudilho que não faz senão legislar em causa própria... sem vergonha, sem pudores, sem explicação.

E nós seguimos calados, vitimados, violentados, empobrecidos em nossa mobilidade, em nossa segurança, em nossa dignidade. Temos nosso trânsito reduzido aos poucos lugares em que nos sentimos seguros (e nunca estamos), diante de uma polícia insuficiente, mal equipada, mal treinada e levada ao limite da impotência (e do descaso) diante de sua única obrigação, que é garantir que possamos, com o fruto do dinheiro que conferimos ao governo em suas esferas municipais, estaduais e federal, ter nossa liberdade de ir e vir assegurada. Mas nem ir, nem vir, nem bem ficar em lugar algum, pois as estatísticas não impressionam mais, não inibem, não condenam criminosos, mas aprisionam uma população civil desarmada, inerte e institucionalmente indefesa. Cada morte violenta que, por algum motivo, mobilize a mídia, gera protestos, passeatas, gritos por paz jogados à arena dos lobos, famintos por sangue e dinheiro. Sempre que isso acontece, vemos um familiar enlutado e destruído em sua dignidade perguntar: “quantos mais terão que morrer para que algo mude?”. Pois a resposta que temos recebido em posição inequívoca de nossas “autoridades” é “pouco importa!”. Não há qualquer mudança de curso, proposta de ação, debate dos setores responsáveis sobre que providências tomar, como tratar de problemas que exigem uma resposta: ampla, enérgica, imediata!


Sim, estou revoltado! Sinto-me invalidado, destituído de minhas conquistas, seguidamente ludibriado por um país que, apesar das promessas, não deu qualquer indício de ser o país do futuro. Mas levanto minha voz, minha palavra, minhas ações. Não vou morrer quieto em um sinal fechado ou passeando com minha esposa e meu cachorro. Vou gritar mais alto e mais longe e convido quem quiser a erguer também sua voz.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Saudade


A mão aproxima o rosto. É o braço esquerdo que sobe lentamente em direção à face; a cabeça se curva levemente. Mão e rosto se tocam... 
                                         suavemente.

O gesto.

A intenção - são. E salvo? E salvo! Salvo a imagem, o gesto, a vida é intenção.

Por quantas vezes esse caminho se repetiu, quase ritualmente, lento mas sem vacilar, renovando a aposta. E cada aposta dirige, expõe, afirma. A vida na potência do gesto, da intenção. Ser e fazer... 
                                                         o possível.

A pergunta veio tantas vezes: eu vou morrer? E a resposta nunca escondeu, mas dirimiu o que se colocava: o prazo e não o fato. E quem sabe? E quem jamais saberia? E quem jamais saberá?

Era sempre o gesto a se fazer presente, a manter a aposta em si, lá, dó... pela cena, 
                                     última, 
                                                  ceia. 
A dor crua do inevitável, única e desoladora certeza:                                                                                   sentença.

Mas sobrevive o gesto, que não abandona quem assistiu, amparou, sentiu, viveu a vida escapando... o tecido se desfazendo, o fio puxado de mãos que ironicamente sempre foram tão habilidosas em tecer. 

E da sentença fica uma luz: na intenção, no gesto, no suave toque da sua mão em sua face.

De volta às cinzas, era o vento que soava mais alto. O movimento das folhas, das árvores, do verde da noite, aquela curva na estrada.

Lembrar é reviver a luz, 
                                          da intenção, o 
                                                                                 gesto. 

Sua mão em seu rosto, nosso amor em sua face. 


s a u d a d e

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

pedra 2


Teria Einsten dito em seu leito de morte

“uma pedra quer ser uma pedra”


No alemão, o duplo sentido com o nome do mestre da física


Quem quer ser, quem é?

Não, a vírgula não foi engano

Como talvez não o tenha sido o dito de Einstein


É possível ser algo

Algo além do querer?

O desejo, pedra fundamental...

A pedra querendo ser pedra!

pedra


achei que não voltaria....

e por que não? Ela sempre voltou

não

não essa noite,

não dessa vez,

não!

Clamor, angústia, surdez

que ninguém durma essa noite! O reino deve seguir sua ordem

possamos todos juntos atravessar a escuridão,

o medo,

o vazio

Em nome do amanhecer...

mas não,

Ele não virá,

não dessa vez,

não essa noite.